A brincadeira virou objeto de
estudo no trabalho e constatei, não sei se triste ou feliz, que fui uma
criança-espectadora. Os colegas relatam contentes suas infâncias de pés descalços,
subidas em árvores, elásticos e queimada nas calçadas até que os chamassem para
se lavar e jantar. Eu não precisava que ninguém gritasse meu nome ou me botasse
para dentro. Eu já estava lá. Lendo, imaginando, enfileirando as bonecas e
dramatizando o meu estar-lá-fora. Eu não me aventurava. Era uma criança de “assistimentos”.
Uma criança que imaginava, uma pré-adolescente que lia _às vezes mais de um
romance por dia - e, na juventude, fazia-me de cupido para as amigas. Sempre
espectadora, escrava do medo que me
aprisionava às letras. Lendo, eu poderia ser quem quer que fosse. Escrevendo
também. Comprei a minha liberdade com o bilhete que me dava cadeira para
assistir minha própria vida. Encenei. Hoje, quando falo em público, mal
acredito que quem esteja lá seja mesmo eu. Subo no palco. Mas na plateia, ainda vejo,
na última fila, a imagem de mim mesma. Sentada, assistindo, espectadora do meu
próprio milagre.
Depoisque os filhos
chegam a gente percebe o quanto se gasta
de tempo e dinheiropara se manter
uma mulhercomummínimo
de aparência: depilação, unha, tintura
de cabelo, roupa,
sapato, bolsa,
maquiagem, perfumes,
cosméticos, filtrosolar... É muitacoisa! Vocêpoderiadizerque se eu
fizesse tudoissoemcasa
economizaria bastante, certo? Errado. Depois
de horas na cozinha,
darbanhoemcriança, lavarlouça, lavarroupa, trabalharfora, fazercomida, arrumarmochila pra escola, nãosobradisposiçãopara se depilaroufazer as unhas na madrugada.
Às vezeseu faço, quandonão tenho quefazeralgo do
trabalho nesse horário,
o quenão
é raro. Vendo cosméticosporcatálogoparacomplementar
a renda, o queme dá descontos
ao comprar pra mim.
Algumas vezes a linha
tem cincoprodutospara a pele
e eusóusodois,
poisjá
estou morta e semcoragem. Tintura
de cabelo é uma desgraça.
No fim, não
é só o cabeloque está pintado,
mas a casatoda. Sou umfiascocomocabeleireira de ocasião.
Pra disfarçar vou arrancando os fiosbrancos, masnão adianta muito.
Roupatambém
é umparto.
Paracomprarbarato é precisopesquisar e eunãogostomuito de andaremloja,
prefiro comprar na internet.
O problema é quepensomuito
(sempre fui muitocomedidacomdinheiro) e acabo não
comprando nada. Ou
seja, acabo malvestida,
mal depilada, grisalha
e de unha lascada... Estressada, ataco a geladeira
e acrescento GORDA à lista. Aindamaisquando o marido resolve fazerbolo de chocolateoupudim
de leite... 2014 chega
e comelecomeço uma dieta,
compro doisvestidos
e vamos ver no que
vai dar esta empreitada
de serumpoucomaisMULHER...